sábado, 19 de junho de 2010

Um olhar sempre atento




Enfatizar o melhor ângulo, descobrir nuances e mostrar o que um olhar desatento costuma deixar passar. Ao longo dos seus 40 anos de carreira, foi dessa forma que o fotógrafo Hélio Nunes, editor de Fotografia do POPULAR, morto na sexta-feira, dia 19 de fevereiro, aos 54 anos, vítima de complicações renais, encarava seu trabalho. E era assim também que comandava sua equipe: era preciso fazer de tudo para mostrar o que quase nunca enxergarmos corriqueiramente e que o repórter de texto pouco pode fazer para transmitir com a palavra.



Tanto na função de repórter-fotográfico e mais tarde como chefe de Fotografia, Hélio Nunes sempre se revelou dono de um senso jornalístico aguçado e exigente.

Não foi à toa que nas suas quatro décadas de carreira, toda ela no POPULAR – onde começou como operador de telefoto –, fez coberturas memoráveis e recebeu diversas premiações. Histórias para contar e, em seu caso, mostrar, não lhe faltavam.

São narrações visuais marcantes, curiosas, históricas. Em sua vasta produção jornalística, Hélio não economizou cliques para captar momentos memoráveis. O que dizer, por exemplo, da imagem de um pintinho ciscando despreocupadamente ao lado da enorme pata de um elefante?

Agraciada em 1994 entre os destaques do prêmio World Press Photo, um dos mais importantes do fotojornalismo mundial, a imagem é daquelas que ficam na retina.

Mas Hélio não era de revelar muitos detalhes que envolviam a captação de uma imagem como essa. Falava pouco do próprio ofício. Simplesmente gostava que suas fotos fossem vistas. Era assim que exibia com orgulho os resultados de um dos trabalhos de que mais gostava de relembrar: as coberturas das Copas do Mundo de Futebol da Espanha (1982) e do México (1986).

Alguns desses resultados são cliques marcantes como os de um clássico entre Brasil e Argentina (vencido pelos canarinhos) no mundial de 82. Em um dos enquadramentos mais significativos estão os jogadores Júnior e Diego Maradona, em uma disputa acirrada pela bola.

Hélio também era um cronista visual, que sabia retirar poesia do cotidiano da cidade. Soube ainda retratar como poucos acontecimentos que marcaram o Estado, como o trágico incêndio da Matriz de Pirenópolis, em setembro de 2002, e o sequestro do avião da Vasp em 1988.

Registros históricos
Momentos históricos também foram registrados pelas lentes de Hélio Nunes. São de sua autoria muitas fotos impressionantes que retrataram a Praça Cívica em uma das maiores reuniões populares do Brasil no movimento das Diretas Já, em 1984, em plena derrocada da ditadura militar. Entre os personagens, Ulysses Guimarães, Tancredo Neves e José Sarney.

Outros momentos importantes, estes em solo estrangeiro, foram os registros de uma viagem internacional empreendida por uma comitiva do então presidente Fernando Henrique Cardoso, em 2001, e uma expedição à Antártida. Na viagem com Fernando Henrique, atento, Hélio captou cenas hoje já importantes para a posteridade, que mostram o líder timorense Xanana Gusmão, mais tarde presidente do Timor Leste, e o diplomata brasileiro Sérgio Vieira de Mello, morto em 2003 em um atentado em Bagdá.

Históricas também passariam a ser as imagens registradas em preto e branco de “Aninha, a menina feia da ponte”, como Cora Coralina se definiu em um poema. Sempre encantado com a cidade de Goiás e seus personagens, Hélio tinha simpatia declarada ao local.

Mesmo nos assuntos corriqueiros, Hélio buscava um ângulo diferente, inusitado. Numa entrevista ao POPULAR, em 1990, ao comentar sobre o período em que se dedicava mais à cobertura policial, ele deu a seguinte explicação sobre como fazia para não cair na mesmice: “Para o trabalho não ficar muito repetitivo, procurava pegar as pessoas distraídas, fazendo os gestos mais extravagantes, agachadas, pegando bilhetinho no chão. Era o flagrante que me interessava mais.”

Hélio Nunes - 1956 - 2010

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