domingo, 20 de junho de 2010

“Nosso atraso político se explica perfeitamente pelo nosso sangue negro”


Operários, de Tarsila do Amaral: um retrato da miscigenação brasileira




De acordo com o sociólogo e jornalista Ali Kamel, nós brasileiros não somos racistas.

De acordo com o senador Demóstenes Torres (DEM-GO), nós brasileiros temos uma história muito bonita de miscigenação e, no dia seguinte à abolição da escravidão, os negros eram cidadão como todos os demais cidadãos.

Eu me lembrei de uma pequena evidência do belo passado de miscigenação da sociedade brasileira; do estatuto de cidadãos dos homens negros e das mulheres negras, no final da década 1930; e da inexistência de racismo no Brasil.

Quando desembarcou no Rio de Janeiro, em 1938, a antropóloga Ruth Landes
(1908-1991), doutora em antropologia pela Universidade de Colúmbia, sob a orientação de Ruth Benedict, precisou se apresentar a altos funcionários do governo e da Polícia Federal, para provar sua identidade e a inocência de seus estudos, cujo tema era o candomblé da população negra de Salvador. Uma das altas autoridades às quais Landes se apresentou foi o Ministro das Relações Exteriores, Osvaldo Aranha (1894-1960), que, após ler a carta de apresentação que ela lhe entregara, lhe disse:


Esta carta diz que a senhora não é um desses repórteres sensacionalistas. Ótimo. O Brasil precisa ser corretamente conhecido. Especialmente a sua situação política, e, uma vez que vai estudar os negros, devo dizer-lhe que o nosso atraso político, que tornou esta ditadura necessária, se explica perfeitamente pelo nosso sangue negro. Infelizmente. Por isso, estamos tentando expurgar esse sangue, construindo uma nação para todos, “embranquecendo” a raça brasileira.

[LANDES, Ruth. A cidade das mulheres. 2. ed. rev. Rio de Janeiro: UFRJ, 2002. p. 40-41.]


A nação que a ditadura de Getúlio Vargas
(1882-1954) estava construindo era para todos, menos, obviamente, para a população negra, que deveria desaparecer no decurso do processo de embranquecimento.

Aquilo que perturba parcela dos críticos do sistema de cotas – os adversários racistas dos sistema de cotas, não todos os críticos – é a perspectiva de que a sociedade brasileira possa se tornar uma nação onde a população negra tenha um lugar, ou seja, uma nação efetivamente para todos.

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